“Acima das Nuvens” oferece uma reflexão sobre o tempo.
O experiente diretor francês Olivier Assayas alcançou reconhecimento internacional com “Acima das Nuvens”. Principalmente porque conseguiu comprovar o talento de Kristen Stewart, que ainda precisava mostrar que era mais que a Bella da trilogia “Crepúsculo”. E a parceria deu tão certo que se repetiu no filme seguinte de Assayas, “Personal Shopper” (2016).
Juntamente com Stewart, outro grande nome, este já consagrado, encabeça o elenco: Juliette Binoche, no papel de Maria Enders, uma respeitada atriz de teatro e cinema. E, no filme, ela e sua assistente Valentine (Kristen Stewart) viajam de trem para a Suíça, onde Maria receberá um prêmio em nome do amigo dramaturgo Henryk Wald. No passado, ele foi o responsável por revelar o talento dela em seu primeiro trabalho no palco, como a jovem Sigrid, que na peça levava sua chefe Helena ao suicídio. Mas, durante a viagem, ela recebe a notícia de que o autor acaba de morrer.
Sils Maria
Na segunda parte do filme, Maria chega à casa de Henryk Wald. De lá, a viúva a leva até as montanhas para que conheça as nuvens de Sils Maria. E elas ganharam esse nome porque se formam entre as colinas sobre um lago e se juntam em um agrupamento estreito, movendo-se como se fosse uma serpente. Então, um jovem diretor, Klaus Diesterweg (Lars Eidinger), convida-a a atuar na mesma peça em que começou sua carreira, mas agora no papel de Helena e não da jovem Sigrid, que seria interpretada por Jo-Ann Ellis (Chlöe Grace Moretz), uma jovem celebridade em evidência.
A princípio, Maria está relutante, porém, gradativamente se convence a aceitar a proposta. Porém, nesse processo, precisa amadurecer a ideia da passagem do tempo. Assim, na parte final de “Acima das Nuvens”, formalmente chamada de “epílogo” na tela, Maria observa a conturbada vida pessoal de Jo-Ann Ellis. E reconhecerá nela suas atitudes quando tinha essa idade. Essa perspectiva a convencerá a aceitar o papel de Helena.
Análise do filme
Essencialmente, o diretor Olivier Assayas emprega recursos do cinema moderno para contar sua estória em “Acima das Nuvens”. Nesse sentido, a utilização constante do fade-out conscientemente reflete a questão do tempo no filme, marcando a sua passagem a cada sequência. Além disso, ao escurecer a tela, o recurso convida o espectador a refletir sobre o que acabou de assistir. E este é um exercício que Maria começa a praticar desde a notícia da morte de Henryk Wald, quando o fade out é empregado pela primeira vez. A intenção é mostrar seu corpo sendo encontrado nas montanhas nevadas.
Por outro lado, a conversa dentro do carro entre Maria e o produtor local, tendo Valentine no banco dianteiro de passageiro e os dois atrás, é filmada com a câmera colocada de fora do carro. Desta forma, permite que o reflexo dos arredores do caminho apareça no vidro do veículo, o que reproduz o desconforto pelo que passa Maria. E, logo em seguida, no hotel, alguns jump cuts, ainda que discretos, enfatizam a perturbação da veterana atriz. Similarmente, em outro momento, uma agitada música eletrônica contrasta com a trilha clássica utilizada na maior parte do filme. Com isso, destaca o transtorno na mente de Valentine quando ela deixa Maria para se encontrar com uma paquera do momento.
Quando Maria e Valentine ensaiam a peça, surgem saudáveis discussões. Na verdade, em várias cenas, a metalinguagem se torna duvidosa, pois os diálogos se encaixam no que as duas personagens podem estar sentindo. Mas, enquanto Maria se torna resistente à ideia de não poder interpretar a jovem Sigrid, ela despreza qualquer tentativa de Valentine apresentar uma leitura séria do filme de ficção científica estrelado por Jo-Ann Ellis.
Conclusão
Em um momento crucial do filme, Assayas evidencia o argumento de Valentine de que a interpretação sobre o destino de Helena na peça depende da perspectiva de quem o analisa. Em outras palavras, ela pode ter se suicidado ou simplesmente resolvido desaparecer. E, de maneira inteligente, o plano/contraplano do diálogo coloca Maria sob um clima de sol, pelos olhos de Valentine. Por outro lado, esta se encontra na neve, pela perspectiva de Maria. Por fim, a assistente resolve deixar sua chefe, que sai a sua busca pelas montanhas. Desta forma, deixa o espectador apreciar sozinho a passagem das nuvens em formato de serpente. E, assim, interpretar seu efeito na personagem que leva parte do nome do local, Sils Maria. Caso Assayas desejasse um final aberto, essa cena poderia encerrar o filme . Porém, o epílogo definitivamente fecha “Acima das Nuvens”, evitando interpretações que dependem da perspectiva do espectador.
Ficha técnica:
Acima das Nuvens (Clouds of Sils Maria, 2014) Dir/Rot: Olivier Assayas. Com Juliette Binoche, Kristen Stewart, Chloë Grace Moretz, Lars Eidinger, Johnny Flynn, Angela Winkler, Hanns Zischler, Nora von Waldstätten, Brady Corbert, Aljoscha Stadelmann, Claire Tran, Stuart Manashil, Ricardia Bramley, Luise Berndt, Caroline De Maigret.