Adaptação do livro de Taylor Jenkins Reid, a série Daisy Jones & The Six conta a meteórica trajetória de uma banda de rock nos anos 1970. Embora não seja uma banda que existiu, o autor admite que se baseou na relação entre o guitarrista Lindsey Buckinham e a vocalista Stevie Nicks, ambos do Fleetwood Mac. As canções da série, inclusive, lembram bastante o estilo desse grupo musical.
Os criadores da série são os aclamados Scott Neustadter e Michael H. Weber. A dupla escreveu o roteiro de (500) Dias com Ela [(500) Days of Summer, 2009], A Culpa é das Estrelas (The Fault in Our Stars, 2014) e Artista do Desastre (The Disaster Artist, 2017), pela qual receberam uma indicação ao Oscar. E, aqui eles não desapontam. Na estrutura, dividem a série em capítulos como se fossem as faixas de um LP. Logo de cara, se arriscam em entregar parte do que acontecerá com os personagens. Primeiro, que o último show da banda acontece em 1977. Além disso, que vinte anos depois os integrantes ainda estão vivos e concedem depoimentos individualmente para uma entrevistadora. Ou seja, nessa particular história de rock, nenhum dos músicos vai morrer prematuramente.
Das origens ao sucesso e aos problemas
As entrevistas servem para chamar os flashbacks que contam a jornada da banda Daisy Jones & The Six. Os integrantes (e outros que participaram dessa história) comentam as passagens com suas opiniões posteriores, o que coloca um tempero especial na trama, e até um toque de suspense (do tipo: por que tal pessoa está dizendo isso?). Enfim, assim começa o enredo principal que caminha cronologicamente. E, ao contrário do que acontece nos documentários musicais, aqui os primeiros capítulos, que mostram a formação da banda, são bem interessantes.
Os rumos dos dois protagonistas começam separados. Enquanto Daisy Jones (Riley Keough) perambula pelas casas de shows como uma fã, Billy Dunne (Sam Claflin) já inicia sua carreira como vocalista de rock, ao lado do irmão Graham (Will Harrison) e a sua banda que vai se consolidando. Os destinos se cruzarão em Los Angeles, por meio do produtor Teddy Price (Tom Wright), colocando em rota de colisão dois líderes (frontmen) numa só banda. No meio dessas faíscas, é claro que o fogo da paixão se acenderá.
Da mesma forma, não surpreende que as drogas e as bebidas entrem no caminho. No de Billy Dunne, antes mesmo de conhecer Daisy, quando ele estraga uma turnê vencedora da sua banda e precisa ir para a reabilitação. Já sua colega vai aumentando as doses de pílulas e cocaína conforme o sucesso aumenta. O filme trabalha com consistência o fato de Billy contar com o apoio de sua esposa Camila (Camila Morrone), personagem que ganha importância equivalente ao dos outros membros da banda. Ela lhe dá forças para superar o vício, mas também ancora sua paixão por Daisy.
Desarmonias
Mas nem tudo funciona bem na série. A personagem de Riley Keough soa um tanto indefinida em alguns trechos. A princípio, ela parece insegura de seus dotes musicais. Mas, impulsionada pelo produtor, acaba se mostrando atrevida e até prepotente, ousando roubar o show do The Six na cara dura. Porém, apesar de toda essa sua força obstinada em se tornar uma estrela, ela sucumbe a um casamento no qual o marido a induz a se afundar nas drogas. E Daisy fica nessa inconstância, o que acaba afastando a empatia do espectador. Talvez, a intenção talvez seja mesmo essa, de humanizar a personagem, afastando-a de um arquétipo.
Os arquétipos ficam mesmo por conta de Camila, condescendente demais com a relação entre Daisy e seu marido. Esta, pelo menos, exercita uma virada nos últimos capítulos. Mais fraca mesma é a personagem Simone Jackson (Nabiyah Be), a melhor amiga de Daisy. Não vemos nada que justifique tamanha amizade, e ela depois parte para Nova York e precisa decidir entre o sonhado contrato com uma gravadora e manter o seu relacionamento lésbico (como na história real de Whitney Houston). Mas, até o final ficamos com a sensação de que Simone é uma personagem acessória, e que contribui para tornar lento alguns dos capítulos do meio da série.
Encore matador
Para o bem da série, o último capítulo possui uma estrutura narrativa inventiva que se encaixa bem no enredo. Enquanto rola aquele que seria o último show de Daisy Jones & The Six, a trama intercala os fatos que levaram à implosão da banda justamente em seu auge. A justificativa para os dois protagonistas soa muito sólida: apesar da incontestável paixão entre eles, os dois são tão parecidos que se ficassem juntos iriam os dois para o buraco (leia-se: se afundariam nas drogas e no álcool por conta de seus pensamentos negativos). E é legal que o enredo não abandona os demais personagens; todos têm seu desfecho revelado, inclusive com uma surpresa inesperada.
Quanto à produção, tudo é excelente. Começando pela irretocável reconstituição de época até os shows bem autênticos, tudo soa verdadeiro. Alinhada ao enredo, faz muita gente pensar que se trata de uma cinebiografia de alguma banda que realmente existiu.
Por fim, o que falta para tornar Daisy Jones & The Six verdadeiramente empolgante, além de uma protagonista melhor definida, são canções mais poderosas, daquelas que entusiasmam logo na primeira ouvida. Provavelmente por isso não conseguimos ouvir os ecos de Elvis Presley em sua neta Riley Keough que, apesar disso, sobre para um patamar mais alto em sua carreira de atriz.
___________________________________________
Ficha técnica:
Daisy Jones & The Six | 2023 | EUA | 10 episódios de 49 min | Criado por Scott Neustadter e Michael H. Weber | Elenco: Riley Keough, Sam Claflin, Camila Morrone, Suki Waterhouse, Will Harrison, Josh Whitehouse, Sebastian Chacon, Nabiyah Be, Tom Wright, Timothy Olyphant, Seychelle Gabriel, Ayesha Harris, Ross Partridge.