E o Sangue Semeou a Terra exemplifica o faroeste psicológico de Anthony Mann, em especial no desenvolvimento dos seus dois protagonistas.
Além disso, o filme marca a segunda vez que o diretor escala James Stewart como protagonista, após a parceria em Winchester 73 em 1950. Juntos, fariam juntos oito filmes em cinco anos, seis deles dentro do gênero faroeste. E Mann carrega a influência dos filmes policiais que realizou na década de 1940, principalmente na construção dos personagens.
Em E o Sangue Semeou a Terra, James Stewart interpreta Glyn McLyntock. Ele é um ex-bandido que, após quase morrer na forca, resolve se regenerar. Por isso, escolta uma caravana de pioneiros que pretendem se estabelecer em terras no Estado do Oregon. Mantendo seu passado em segredo, Glyn tem planos de ser fazendeiro nessa região.
Ao longo do Rio Colorado
A estória se passa num Velho Oeste não tão velho. A civilização já se encontra razoavelmente desenvolvida, pelo menos nas cidades maiores, como a Portland do filme. Além disso, os pioneiros realizam parte do trajeto em um grande barco a vapor pelo Rio Colorado. Porém, as leis ainda são frouxas, e Tom Henricks, o dono dos principais estabelecimentos em Portland, se aproveita disso. Quando a população cresce de repente com a descoberta de ouro na região, ele inflaciona os preços. Com isso, não entrega a mercadoria previamente comprada pelos pioneiros, e Glyn precisa tomá-la à força.
Assim, a grande aventura de E o Sangue Semeou a Terra consiste em transportar essa carga de Oregon até a área dos pioneiros. A travessia deve ser ligeira, pois em poucos dias começará a nevar e os pioneiros ficarão sem comida. Em adição, Hendricks e seu bando querem recuperar a mercadoria. Por outro lado, Glyn recebe a ajuda de dois pistoleiros: Emerson Cole (Arthur Kennedy) e Trey Wilson (Rock Hudson). Tal qual Glyn, Cole também é um ex-bandido. Já Trey é um jovem jogador de pôquer imaturo. Além deles, o grupo inclui o líder dos pioneiros e sua filha Laura, e alguns mineradores contratados como ajudantes.
Glyn e Cole
A questão psicológica se concentra, essencialmente, nos protagonistas Glyn e Cole. O personagem de James Stewart permanece íntegro até o fim, sempre defendendo os pioneiros e dedicado a cumprir sua responsabilidade de levar os alimentos a eles. Já Cole alterna sua atitude. Primeiro, se mostra leal a Glyn, em agradecimento por este salvar a sua vida. Em seguida, continua a ajudar os fazendeiros porque se apaixona por Laura. No entanto, aparece a oportunidade de ganhar muito dinheiro vendendo a mercadoria para um grupo de mineiros no meio do caminho, ao invés de entregar aos pioneiros. Então, a ganância de Cole o cega, e ele se volta contra Glyn.
Sobre esse ponto, o líder dos pioneiros sempre declara que não confia em Cole porque ele é um ex-bandido, e que não acredita em sua regeneração. Porém, ele não sabe que seu confiável guia Glyn também já foi um fora-da-lei. Ao fim do filme, fica evidente a mensagem de que não é correto generalizar, pois cada pessoa é diferente. De fato, Cole não merecia confiança, mas Glyn prova que sempre será leal.
Coadjuvantes
Quanto a Rock Hudson, ele também estava em Winchester 73, mas ainda se encontrava em início de carreira. Sua beleza é explorada em E o Sangue Semeou a Terra, logo despertando a paixão da irmã caçula de Laura. Porém, seu personagem não ganha profundidade. Trey ainda não sabe bem o que quer da vida, e não vemos os motivos que o fazem se aliar a Glyn contra o empresário inescrupuloso Hendricks.
Ainda sobre os personagens e o elenco, Laura igualmente salta de galho em galho em relação ao homem que quer como marido. A princípio, já estava decidida a ficar com Glyn. Porém, quando fica na cidade por estar se recuperando, se apaixona por Cole. Por fim, ao descobrir que este é um mau caráter, volta a escolher Glyn. Quem a interpreta é Julie Adams, que ficou mais conhecida pelo papel de protagonista no horror B O Monstro da Lagoa Negra (1954).
Aspectos do filme
Sob outro aspecto, E o Sangue Semeou a Terra possui momentos de ação espalhados. O primeiro envolve um ataque de índios ao acampamento dos pioneiros. Filmadas em estúdio, essas cenas soam bem artificiais, tanto pela vegetação limpíssima em pleno Velho Oeste poeirento, quanto pelas lutas em que os índios parecem frágeis demais. Posteriormente, há a fuga de Glyn e sua turma perseguidos pelo grupo de Hendricks na cidade. Por fim, o embate em que Cole, acompanhado de mineiros, enfrentam Glyn, Trey, Laura e seu pai. Estes dois outros momentos são filmados com competência, e não desapontam.
Mas, há um trecho que não deveria estar no filme, pois revela muito desleixo. E é a cena em que o barco a vapor viaja pela primeira vez com os pioneiros. Ao se aproximar de uma cachoeira, vemos um corte para uma imagem de uma enorme catarata que, claramente, não faz parte daquele rio. Não só a qualidade dos quadros é totalmente diferente, como o raccord, o olhar dos personagens, não se encaixa com o que é mostrado. E não se pode culpar Anthony Mann por isso. Afinal, na época dos grandes estúdios, o diretor nem tinha acesso ao corte final.
De qualquer forma, o que se destaca em E o Sangue Semeou a Terra é o comportamento distinto dos seus dois protagonistas. Acima de tudo, descobrir como se comportarão Glyn e Trey representa o essencial desse faroeste.
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Ficha técnica:
E o Sangue Semeou a Terra (Bend of the River) 1952. EUA. 91 min. Direção: Anthony Mann. Roteiro: Borden Chase. Elenco: James Stewart, Arthur Kennedy, Julie Adams, Rock Hudson, Jay C. Flippen, Lori Nelson, Chubby Johnson, Stepin Fetchit, Harry Moran, Howard Petrie.
