O diretor cearense Karim Aïnouz vem numa sequência de bons filmes. Tanto na ficção A Vida Invisível (2019), quanto nos documentários Nardjes A. (2020) e Marinheiro das Montanhas (2021), desconsiderando a produção internacional Firebrand (2023), que não chegou por aqui. Seu novo filme, Motel Destino mantém o alto nível – mas num degrau abaixo, apesar da indicação à Palma de Ouro.
A trama lembra o livro “O Destino Bate à sua Porta”, de James M. Cain, como aponta o nosso crítico Sérgio Alpendre, que viu Motel Destino no Festival de Gramado. Mas, na coletiva de imprensa de 14/08 em São Paulo, Aïnouz preferiu citar Brian De Palma como principal influência para esse filme. Revelação que, a princípio, surpreende, porém, é possível encontrar traços depalmianos na obra. O uso de luzes fortes em ambientes fechados (dentro do motel iluminado com lâmpadas vermelhas e azuis), o suspense que tem como ponto de partida o sexo, são características que remetem especialmente a Vestida para Matar (1980) e Dublê de Corpo (1984).
O jovem Heraldo (Iago Xavier) vai para o tal Motel Destino com uma mulher que conhece na balada. Mas acaba preso dentro do quarto, e chega atrasado ao local onde ele e seu irmão executariam um empresário francês. O plano não dá certo por sua culpa e agora Heraldo precisa se esconder da chefe do crime que encomendou o assassinato. Acaba voltando ao motel, onde deixara sua carteira de identidade, e a dona do estabelecimento, Dayana (Nataly Rocha), aceita acolhê-lo em troca de serviços de ajudante geral. O marido dela, Elias (Fábio Assunção), reluta no início, mas depois aprova a permanência do rapaz, que trabalha muito bem.
Thriller
O suspense funciona quando Heraldo e Dayana iniciam um relacionamento, ali mesmo no motel, correndo o risco de serem descobertos pelo marido. O ambiente, monitorado por várias câmeras de segurança, aumenta o perigo. O outro suspense, em relação à possibilidade de os bandidos descobrirem o esconderijo de Heraldo, não é bem explorado. Nem mesmo quando o rapaz e Elias saem para as ruas para fazer compras, na cena em que um dos membros da gangue está na mesma loja. Em situação similar, Billy Wilder criou um suspense imenso em seu noir Pacto de Sangue (1944).
O enredo de Motel Destino esvazia de vez o perigo de descobrirem o protagonista quando o tal empresário francês morre bestamente no motel. E nem precisava ser ele o morto, pois o que acontece em seguida (esconder o corpo) decorre do receio de Elias de ter a polícia ali. A desova do defunto, aliás, também desperdiça o suspense e ainda faz a conclusão parecer uma repetição da mesma situação.
Erótico
Vendido como um thriller erótico, Motel Destino não é tão picante como tenta parecer. Ainda mais se colocado ao lado de outros filmes brasileiros atuais, principalmente da região Nordeste. Para a narrativa, isso importa porque o filme falha em demonstrar uma atração sexual irresistível entre Heraldo e Dayana, capaz de justificar que ela aceite alojar esse desconhecido sob o seu teto. E, da mesma forma, para se atracarem dentro do motel, correndo um risco enorme de serem descobertos. O erotismo, na verdade, está onipresente por ser um motel, com os gemidos dos amantes ecoando pelos corredores. E até nas espiadelas de Elias, voyeur dos clientes e até do casal de jumentos – o que garante uma boa piada quando o animal depois fica olhando os protagonistas na cama.
De qualquer forma, o ritmo ágil mantém o interesse durante todo o filme, também porque os personagens são interessantes por suas peculiaridades que os afastam do lugar comum. Nem precisava envolver as relações com o crime, somente o suspense dos amantes às escondidas seria suficiente para criar muita tensão, e talvez esquentar mais o clima.
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Ficha técnica:
Motel Destino | 2024 | 115 min. | Brasil, França, Alemanha, Reino Unido | Direção: Karim Aïnouz | Roteiro: Wislan Esmeraldo, Karim Aïnouz, Mauricio Zacharias | Elenco: Fábio Assunção, Nataly Rocha, Iago Xavier, Renan Capivara, Yuri Yamamoto, Fabíola Líper, Isabela Catão, Jupyra Carvalho.
Distribuição: Pandora Filmes.