O Jogo da Invocação combina um roteiro ruim e uma dupla de diretores estreantes que não sabe construir os mais básicos recursos do terror. O enredo não se decide entre a possessão e a maldição, e acaba misturando os dois temas num conjunto ineficaz. Para começar, erra ao deixar em elipse o momento em que o menino Jonah, de 13 anos, encontra uma velha faca na floresta. Vemos isso em relance, enquanto sua irmã Billie (Natalia Dyer) narra o acontecido como se fosse algo que já aconteceu. Mas esse incidente possui grande importância para a história, pois o objeto leva a maldição para a casa dos Fletchers. E, por isso, renderia uma boa carga de tensão se estivesse devidamente inserida no filme.
E esses Fletchers são bem antipáticos. Exceto pela mãe, trabalhadora e zelosa, que carrega a família nas costas, todos os demais são uns imprestáveis. Os três irmãos – além de Jonah e Billie, tem também o mais velho, Marcus (Asa Butterfield) – ficam brigando um com o outro o tempo todo, falando baixaria para se ofenderem. Além deles, na casa ainda mora o tio, um beberrão que não quer saber de trabalhar. É difícil o público torcer por essa turma, o que torna o filme ainda mais intragável. Aparentemente, a proposta dos roteiristas seria que a experiência traumática que os irmãos viverão servisse para uní-los, sendo essa a sua grande mensagem. Aliás, como o enredo é fraco, a narração da protagonista precisa afirmar expressamente essa transformação.
A maldição
Enfim, a faca amaldiçoada logo toma conta do espírito de Jonah. Crianças endemoniadas podem ser extremamente assustadoras, mas os realizadores não confiam nisso. Por isso, logo a possessão se transfere para Marcus, que já é um homem crescido e tem força física para atacar os demais personagens. Num filme de terror, isso pouco importa, pois a força vem do sobrenatural. Mas os diretores fazem várias escolhas que, como essa, demonstram desconhecimento sobre o gênero. Assim, é Marcus que começa a agir como o serial killer da vez, empilhando cadáveres como num slasher de terceira classe.
No meio da história, os diretores resolvem contar a origem da maldição da faca. Carentes de imaginação, fazem o relato através de um diário encontrado junto com o objeto. Porém, nem faz diferença, pois a motivação não faz sentido. A bruxa – a trama se passa em Salém (que surpresa, não?) – quer se vingar da morte dela e do irmão, que foram falsamente acusados e queimados na fogueira. Ora, custava inventar alguma conexão com os Fletchers? Como não há ligação, a maldição então não tem destino certo. Ou seja, azar de quem achar a tal faca.
Brincadeiras mortais
E olha que a materialização da bruxa e do seu irmão, vindos do além, até que é bem-feita. Fosse ela mais bem trabalhada, poderia render momentos aterrorizantes. Porém, a dupla de diretores não consegue isso, e nem mesmo provocar jump scares. Nessas situações, mostram os perigos no fundo da cena, em segundo plano, sem uma música ou efeito para assustar.
Além disso, o personagem Marcus, perto do final, demonstra peso na consciência pelas mortes que causou. O que quebra todo o mito da possessão, afinal, ele não estava consciente para se lembrar do que fez. Para piorar, nessa cena vemos flashs rápidos de todos os seus assassinatos, como se o espectador precisasse disso para se lembrar do que acabou de ver na tela.
O Jogo da Invocação não tem mesmo salvação. Nada funciona: os sustos, os personagens, o clima de terror, a trama e mesmo a forma como foi dirigido. Desconfia-se que a ideia central era criar o horror em meio às brincadeiras de criança, como o esconde-esconde que aparece no filme. Seria uma ideia interessante, mas o desenvolvimento dessa premissa foi desastroso.
Ficha técnica:
O Jogo da Invocação | All Fun and Games | 2023 | 76 min | EUA, Reino Unido, Canadá | Direção: Ari Costa, Eren Celeboglu | Roteiro: J.J. Braider, Ari Costa, Eren Celeboglu | Elenco: Asa Butterfield, Natalia Dyer, Benjamin Evan Ainsworth, Annabeth Gish, Kolton Stewart, Keith David, Sydney Sabiston.
Distribuição: Diamond Films.
Assista ao trailer aqui.