Era de se esperar muito mais de Os Órfãos (The Turning). Afinal, trata-se de uma adaptação, para os tempos atuais, do livro “A Volta do Parafuso” (The Turn of the Screw); obra que rendeu o memorável Os Inocentes (The Innocents, 1961), de Jack Clayton. Além disso, os responsáveis por levar essa obra de Henry James para as telas são Chad Hayes e Carey W. Hayes, roteiristas de bons filmes de terror contemporâneos, como, por exemplo, Invocação do Mal (The Conjuring, 2013).
O problema parece ser a direção de Floria Sigismondi. Desde 1991, ela dirige videoclipes para artistas famosos como David Bowie, Marilyn Manson, Sarah McLachlan, Sheryl Corw, Jimmy Page & Robert Plant, The Cure, Rihanna, Dua Lipa etc. Porém, realizou apenas um longa-metragem, o interessante The Runaways (2010), cinebiografia da banda que lançou Joan Jett e Lita Ford. Mas, ao sair de seu habitual meio musical e adentrar o cinema fantástico, ela se perde.
Seu background pode explicar o a abertura do filme com a notícia da morte de Kurt Cobain em 1994, e a presença do rock na vida do adolescente Miles (Finn Wolfhard, de Stranger Things). No entanto, não vemos justificativas para atualizar o livro publicado em 1898, a não ser por essas perfumarias musicais. No final das contas, a trama acontece majoritariamente em uma mansão antiga, isolada no meio da mata, com todos os apelos góticos da obra original. Mas, esse não é, nem de longe, a principal questão que atrapalha esse filme.
Conclusão frustrante
O enredo acompanha Kate (Mackenzie Davis), uma professora de ensino infantil que aceita ser a tutora de duas crianças órfãs de alta classe. Para isso, terá que morar no local, uma enorme casa habitada apenas por uma governanta idosa e pelos pequenos herdeiros. Mas, logo ela percebe que o menino Miles é agressivo com ela, e, pior ainda, fenômenos sobrenaturais parecem assombrar o local. Aparentemente, um dos fantasmas quer revelar um sinistro segredo. Ou será apenas imaginação de Kate, que está enlouquecendo como aconteceu com sua mãe?
O filme revela o tal segredo através do fantasma da vítima. Nisso, a narrativa é eficiente, mas logo em seguida o fantasma do assassino tenta matar Kate, materializando-se como se estivesse em carne e osso, uma solução bem questionável. Já a conclusão é absurda, pois encerra a história com um sonho ou uma alucinação (pois tem uma cama dentro da piscina), sem desvendar se a protagonista ficou louca ou se a casa estava assombrada. E, ainda com um corte precipitado que não mostra o que assustou tanto a garota.
Na verdade, o roteiro coloca dois finais. O primeiro se encerra quando Kate descobre que a fantasma da tutora anterior foi estuprada pelo caseiro, e a governanta idosa o assassinou. O segundo, retorna a um ponto anterior da trama para revelar que Kate ficou louca, e só ela vê os fantasmas na casa; por isso, ela estaria no hospício com sua mãe. Porém, nenhum desses dois desfechos é bem explicado no filme, o que deixa o espectador totalmente frustrado.
Não basta só o visual
Por outro lado, Os Órfãos conta com uma produção adequada. Os cenários são sombrios, as aparições sobrenaturais devidamente horrendas, revelando que a diretora Floria Sigismondi acumulou muita experiência em criar visuais elaborados para seus videoclipes. Porém, falta a tarimba para conduzir uma narrativa. Por isso, mesmo os básicos recursos do terror, como os jump scares, falham nesse filme. Não são raros os trechos em que a protagonista se assusta mas o espectador não vê o que provocou essa reação.
A sensação, diante disso, é de um grande desperdício do material de origem. Os Órfãos entrega confusão como se fosse suspense, uma prova de que não se cria o terror apenas com o visual.
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Ficha técnica:
Os Órfãos | The Turning | 2020 | 94 min | Índia, EUA | Direção: Floria Sigismondi | Roteiro: Chad Hayes, Carey W. Hayes | Elenco: Mackenzie Davis, Finn Wolfhard, Brooklyn Prince, Barbara Marten, Joely Richardson, Kim Adis.