Seres Rastejantes (Slither): pelo seu título (no Brasil) e pela sua proposta esperamos dois tipos de filme. Um trash empolgante como O Ataque dos Vermes Malditos (Tremors, 1990) ou um trash mal feito como Anaconda (1997).
A primeira cena é frustrante. Em situações paralelas, acompanhamos um meteoro se aproximando da Terra e uma dupla de policiais dentro de uma viatura em plantão noturno. O suspense surge com a desconfiança de que o aerólito cairá, talvez, em cima dos dois adormecidos plantonistas. Mas, ele aterrissa atrás deles, e eles nem percebem. Difícil negar nossa decepção, porém, logo entenderemos o tom do filme, que não dispensa quebras de expectativas.
Sacando James Gunn
Afinal, o diretor de Seres Rastejantes é James Gunn. Na verdade, seu longa-metragem de estreia. E já marcando presença com características que manterá, em maior ou menor proporção em seus quatro filmes seguintes. Em Super (2010), ele mergulharia com tudo na comédia, com Rainn Wilson como protagonista. Depois, solidificaria suas marcas nos surpreendentes sucessos de bilheteria de Guardiões da Galáxia (Guardians of the Galaxy), nos filmes de 2014 e 2017. E, ainda dirigiria O Esquadrão Suicida (The Suicide Squad, 2021), tentando salvar o fiasco do primeiro filme dessa turma, que teve direção de David Ayer.
O próprio James Gunn escreveu o roteiro de Seres Rastejantes. Por isso, encontramos diálogos muito engraçados, que brincam principalmente com os caipiras broncos do interior dos EUA. Não tanto em relação a sua posição política radicalmente conservadora, como vemos em muitos outros filmes, mas principalmente por serem simplórios. Daí Gunn extrai pérolas como: “Parece a doença venérea que peguei durante a guerra!”, diz um personagem secundário ao ver o monstruoso ser em que se transformou o protagonista Grant (Michael Rooker). Além disso, faz humor também com a música piegas do Air Supply que toca numa cena romântica e depois retorna em trecho de terror.
Além das referências
Por outro lado, James Gunn estava com a imaginação fértil quando criou os monstros do filme. Provavelmente buscou inspiração em Stuart Gordon – de Re-Animator (1985) e Do Além (From Beyond, 1986) – tanto nas figuras horrendas como na ligação com o sexo. Mas, foi além (ops, repetindo o título do filme citado) e construiu criaturas maiores e mais malucas. E, usando efeitos especiais práticos, e não computação gráfica, o que confere um charme todo especial. Mas, prepare-se, pois há muitas cenas repulsivas – principalmente para quem sente nojo de lesmas e larvas.
Referências, aliás, se espalham por todo o filme. Temos a cena da banheira de A Hora do Pesadelo (Nightmare on Elm Street, 1984), a ideia do alienígena que busca um hospedeiro de Alien, o Oitavo Passageiro (Alien, 1979), a parede repleta de fotos da vítima como nos filmes com serial killer, e as pessoas infectadas que se transformam em zumbis como em A Noite dos Mortos-Vivos (Night of the Living Dead, 1968). E, claro, outras várias que divertirão os cinéfilos. Acima de tudo, o que importa é que James Gunn usa as referências, mas cria em cima delas. E, filma imagens iradas como a do corpo dividido ao meio com uma chicotada rapidíssima do Grant em transformação. Sem contar o exagero (apropriado para o filme) da mulher hospedeira e do Grant em seu estágio mais avançado.
Tudo por amor
Sobretudo, a trama se sustenta com coerência. É inteligente a ideia da consciência coletiva que une todos os seres que foram infectados ou gerados a partir do primeiro hospedeiro. Sem contar a ironia de ter como pano de fundo uma história de amor.
E fica a dica de que há uma cena literalmente pós-créditos, lá no fim, depois de todos os nomes envolvidos na produção.
Seres Rastejantes revela a garra de um inspirado e motivado cineasta estreante, disposto a não desperdiçar sua grande chance.
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Ficha técnica:
Seres Rastejantes | Slither | 2006 | 95 min | EUA, Canadá | Direção e roteiro: James Gunn | Elenco: Nathan Fillion, Elizabeth Banks, Michael Rooker, Don Thompson, Tania Saulnier, Gregg Henry, Jenna Fischer, Xantha Radley, Michael Rooker, Brenda James, Rob Zombie.