The Post: A Guerra Secreta levanta duas bandeiras atualíssimas no contexto político e social dos EUA da era Trump: o empoderamento das mulheres e a liberdade de imprensa.
O filme conta a história do enfrentamento do The Washington Post perante o governo do presidente Richard Nixon. O jornal teve a coragem de publicar reportagem sobre documentos secretos que denunciavam que o governo americano há anos sabia que seria derrotado na Guerra do Vietnã, mas mesmo assim resolveu mantê-la. Esse episódio pavimentou a trilha da liberdade de imprensa que permitiu que o caso Watergate viesse a público, também pelas páginas do The Washington Post.
Talentos envolvidos
Três talentos de primeira grandeza encabeçam The Post: A Guerra Secreta, o diretor Steven Spielberg e os atores Meryl Streep e Tom Hanks. No prólogo do filme, Spielberg revisita o campo de batalha, uma versão minimizada daquela de O Resgate do Soldado Ryan (1998), um dos pontos altos de sua carreira. Esse trecho serve para apresentar o personagem Daniel Ellsberg, responsável por revelar os documentos secretos.
E Streep personifica Kay Graham, a herdeira do The Washington Post, desconfortável nessa posição que foi obrigada a assumir depois da morte de seu pai e de seu marido. Insegura, em um ambiente masculinizado, ela mal consegue espaço para falar. Spielberg enfatiza essa posição inferiorizada das mulheres nas reuniões com profissionais da bolsa de valores de Nova York. Principalmente na cena em que as mulheres aguardam do lado de fora da sala de reunião, e somente ela adentra o local ocupado exclusivamente por homens. Adicionalmente, há um momento posterior, na saída do prédio da Suprema Corte. Enquanto o dono do New York Times fala para os repórteres, todos homens, Kay Graham sai por outro lado, onde mulheres aguardam na escadaria.
Personagem hesitante
Assim, não é fácil para o espectador de hoje gostar da personagem de Meryl Streep. Há que se situar naquela época, e compreender o motivo de ela ser tão hesitante. Aliás, o momento mais sentimental, típico na obra de Spielberg, acontece quando ela conversa com a filha sobre sua inaptidão para o cargo, mas não chega a emocionar. Já a opção por manter o tom baixo, sem transformá-la em heroína quando ela assume sua posição de dona da empresa e decide publicar a reportagem denunciadora, foge do estilo do diretor. Porém, isso beneficia o filme, evitando o tom piegas.
Da mesma forma, o Ben Bradelee de Tom Hanks também poderia ser alçado a uma posição heroica, mas o filme não vai por esse caminho. Além disso, Hanks muda seu físico para viver o personagem, mas o resultado é irregular. Às vezes, ele não se parece nada com o próprio ator, em outras, sua aparência é a que todos conhecem. Culpa, talvez, da maquiagem, porém, provavelmente porque sua interpretação não é tão forte. Quanto aos atores, o filme se apoia mais no ensemble cast, onde o grupo de personagens é mais importante que os individuais. Aliás, como era o caso de outro filme sobre jornalismo investigativo, Spotlight: Segredos Revelados. Por isso, quando a turma do The Washington Post triunfa, vencendo a censura do presidente Nixon, a comemoração é da equipe de jornalistas, e não apenas da proprietária do jornal e de seu editor.
A direção de Spielberg
Por outro lado, Spielberg não exibe maneirismos na direção. Mas se percebe que alguns movimentos de câmera procuram reproduzir o estilo dos cineastas da época, o começo dos anos 1970, quando ele começava na profissão. Por exemplo, note o travelling que mostra de longe o jornalista Ben Bagdikian falando em um telefone público e se aproxima rapidamente, como víamos em filmes da época, principalmente policiais.
Enfim, The Post: A Guerra Secreta é um filme maduro de Spielberg, menos sentimental e mais presente em relação ao que acontece atualmente nos EUA. Afinal, os tempos pedem posições firmes e menos escapismo.
Para concluir, o filme foi indicado ao Oscar nas categorias de melhor atriz (Meryl Streep) e melhor filme, mas não deve ganhar nenhum desses prêmios.
