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Poster do filme "Tudo ou Nada"
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Tudo ou Nada

Avaliação:
4,5/10

4,5/10

Crítica | Ficha técnica

Tudo ou Nada (Rien à perdre), da estreante em longas Delphine Deloget, pressupõe que o tema é suficiente para render um bom filme. De fato, parte de uma premissa poderosa: por um descuido, uma mãe pode perder a guarda do seu filho. Não restam dúvidas de que se trata de um dos piores pesadelos para uma mãe – porém, isso não basta para construir um drama emocionante.

Na trama, Sylvie Paugam (Virginie Efira) cuida sozinha de seus dois filhos, o adolescente Jean-Jacques (Félix Lefebvre) e Sofiane (Alexis Tonetti), de 6 anos (segundo a sinopse da distribuidora, mas o ator tem 10). Sylvie costuma deixar os dois filhos em casa enquanto trabalha à noite como atendente em um bar. Em determinada ocasião, Jean-Jacques demora para voltar para casa e Sofiane se queima enquanto tenta fritar batatas sozinho.

A luta contra o sistema

O acidente desperta a atenção da assistência social, personificada por uma gélida profissional chamada Madame Henry (India Hair), que encontra motivos para levar a criança para uma casa de acolhimento. Assim, começa a luta de Sylvie para provar que tem condições de cuidar de Sofiane e que ele não corre nenhum perigo sob sua guarda. Um diálogo com um outro assistente social, já no terço final do filme, manifesta a crítica central desse enredo. A protagonista representa a classe trabalhadora que rala muito, mas ganha pouco. E, para o sistema, uma família com melhores condições econômicas, ou mesmo uma casa de acolhimento, significa menos riscos para os filhos pequenos dessas pessoas. De forma nada sutil, a fala do funcionário entrega que o amor é menos importante que o dinheiro.

Ou seja, nesse roteiro deveras atrapalhado, o sistema considera que a afetividade não é argumento de defesa para Sylvie. Uma família abusiva, mas rica, então, seria mais apropriada que a mãe. Não há problemas que o filme possa levantar essa hipótese, desde que desse espaço para discussões. Renderia até uma instigante cena de tribunal com argumentações inteligentes – como traz o muito superior Anatomia de uma Queda (Anatomie d’une chute, 2023). Esse trecho até elevaria o drama da protagonista, que sai derrotada do embate jurídico. Mas, o filme foge desse aprofundamento. A sequência de tribunal mostra Sylvie e sua advogada na sala, o juiz se sentando, e logo apela para a elipse. Corta para as duas saindo do local e a mãe chorando no carro. Um tremendo desperdício dramatúrgico.

Uma boa mãe

Enquanto isso, o enredo tenta a todo custo manter o outro filho na tela. Provavelmente, para demonstrar que Sylvie é uma mãe zelosa, capaz de compreender a desistência de Jean-Jacques quando está prestes a se apresentar tocando trombeta em público pela primeira vez. Porém, nem nessa intenção o roteiro acerta. Nessa cena, será que foi a melhor decisão para a construção do caráter do rapaz? Além disso, em momento posterior, ela impede a oportunidade de Jean-Jacques perseguir seu sonho de ser chef confeiteiro, pois não quer que ele more em outra cidade. Enfim, embora tente mostrar que a personagem principal é uma boa mãe, o tiro sai pela culatra.

A conclusão, então, frustra o espectador por vários motivos. Primeiro, porque traz uma daquelas soluções que desperta a reação “por que não pensaram nisso antes?”. Segundo, porque reflete o título do filme, que se mostra assim totalmente inadequado. E, por fim, ao ceder a um final feliz, resultando na ideia de que o sistema está errado, mas é possível dar um jeito de driblá-lo.

No quesito formal, a direção de Delphine Deloget cai nos cacoetes do cinema contemporâneo para buscar o naturalismo, como se isso fosse mandatório. Portanto, não faltam aqui a câmera na mão, o uso de locações, a fotografia escura e sem brilho, pessoas comuns como protagonistas. Mas, nem nisso o resultado é alcançado, pois o naturalismo parece acanhado. Pelo menos, a direção não atrapalha outra comovente atuação de Virginie Efira, que faz sua personagem soar verdadeira mesmo nos momentos de desespero e descontrole. Nela, sim, sentimos o desespero da mãe diante do risco de perder o filho – o poderoso tema que o filme prodigaliza.

A luta de uma mãe para dar conta sozinha dos filhos ganhou um retrato mais impactante em outro filme francês, Contratempos (À Plein Temps), de Eric Gravel.

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Ficha técnica:

Tudo ou Nada | Rien à perdre | 2023 | 112 min | França, Bélgica | Direção: Delphine Deloget | Roteiro: Delphine Deloget, Camille Fontaine, Olivier Demangel | Elenco: Virginie Efira, Félix Lefebvre, Arieh Worthalter, India Hair, Mathieu Demy, Alexis Tonetti.

Distribuição: Imovision.

Assista ao trailer aqui.

Onde assistir:
Um homem, um menino e uma mulher encostados em uma grade
Cena de "Tudo ou Nada"
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