Em “Virgínia”, Coppola revisita o mundo dos vampiros
O público ignorou os três filmes que Francis Ford Coppola dirigiu para o cinema neste século. São eles: “Velha Juventude” (Youth Without Youth, 2007), “Tetro” (2009) e este “Virgínia” (Twixt, 2011). É verdade que se situam a muitos quilômetros de distância de suas obras maiores, como “O Poderoso Chefão II” (The Godfather Part II, 1974) e “Apocalypse Now” (1979), mas mantêm vivo seu gênio criativo. Além disso, não se deve julgar mal a carreira de um artista por não produzir apenas obras-primas.
Em “Virgínia”, o toque de mestre de Coppola se sobressai no requinte visual. A sequência do sonho (e posteriormente outras) de Hall Baltimore (Val Kilmer) é representada em bela fotografia em preto e branco. E, como em “A Lista de Schindler” (Schindler’s List, 1993) alguns detalhes ganham um colorido saturado. O vermelho e cores derivadas em tom alaranjado ganham esse destaque, fornecendo uma pista ao espectador para o tema da história. Nesse sentido, Virgínia (Elle Fanning) possui uma cor extremamente branca, denotando uma suposta inocência da menina de 13 anos.
Outro truque visual usado pelo diretor é a tela dividida, marca registrada de Brian De Palma, seu colega cineasta do novo cinema americano dos anos 70. Mas o utiliza talvez apenas como referência, pois não o emprega apenas em cenas em que o suspense depende de situações simultâneas. O compartilhamento da tela por dois personagens que se falam ao telefone já serve de pretexto para esse recurso.
Os vampiros de Coppola
Na história, Hall Baltimore é um escritor de pouco sucesso que viaja de cidade em cidade pelos Estados Unidos para tentar vender seu último livro em solitárias sessões de autógrafos. Em uma pequena cidade, o xerife (Bruce Dern) lhe conta sobre um crime no local onde doze crianças foram assassinadas, e uma conseguiu escapar, garantindo que isso daria um grande livro. Baltimore descobre também que o escritor Edgar Allan Poe passou uma noite no hotel da cidade, hoje abandonado. Interessado, vai até a delegacia visitar um corpo de uma menina encontrado com uma estaca enfiada em seu coração, o que poderia ser o início de uma nova série de assassinatos.
Durante a noite, Baltimore sonha com a sobrevivente do massacre e com o famoso escritor de suspense. Suas visões o ajudarão a descobrir o que de fato aconteceu no trágico evento de anos atrás.
Assim, Coppola aproveita o tema para revisitar o gênero em que iniciou a carreira – com “Demência 13” (Dementia 13, 1963) – trazendo novamente para as telas o horror estilizado de “Drácula de Bram Stoker” (Dracula, 1992) cujas imagens marcantes aterrorizavam com uma mise-en-scène deslumbrante. O mesmo acontece em “Virgínia”, onde o clima de beleza se mistura com a estranheza, surgindo assim o terror, que passa perto do explícito em alguns momentos, mas que prefere espertamente manter a sutileza. Um bom exemplo é a sequência do suicídio, retratado através de sombras, remetendo ao clássico expressionista “Nosferatu” (1922), de F.W. Murnau. Aliás, a música dos créditos finais não deixa essa referência passar em branco.
Em suma, “Virgínia” possui o charme de um filme B de terror, mas estilizado com o requinte de um mestre. A finesse se encontra até na narração, com a voz rouca de Tom Waits.
Ficha técnica:
Virgínia (Twixt, 2011) 88 min. Dir/Rot: Francis Ford Coppola. Com Val Kilmer, Bruce Dern, Elle Fanning, Ben Chaplin, Joanne Whalley, David Paymer, Anthony Fusco, Alden Ehrenreich, Bruce A. Miroglio, Don Novello, Lisa Bailes, Ryan Simpkins, Licas Rice Jordan, Fiona Medaris, Katie Crom, Tom Waits.
Assista: Francis Ford Coppola no Tribeca 2016