“A Travessia”: À altura da travessia de Philippe Petit
A audaciosa façanha de Philippe Petit já havia sido contada no premiado documentário “O Equilibrista” (Man on Wire, 2008). O desafio do diretor Robert Zemeckis, aquele da trilogia “De Volta Para o Futuro” (1985-1990) e de “Forrest Gump – O Contador de Histórias” (1994), então, era transformar esse inacreditável fato em um filme empolgante. E conseguiu.
Para cumprir seu objetivo com êxito, Zemeckis usou seu vasto repertório de gramática cinematográfica. De cara, coloca Philippe Petit (Joseph Gordon-Levitt) falando diretamente para a câmera. A interpretação de Gordon-Levitt reflete a personalidade magnética do próprio equilibrista, dessa forma conquistando de imediato a empatia do público. A mise-en-scène contribui para isso, afinal, ele está no topo da Estátua da Liberdade, com o Empire State ao fundo.
Cenários
As torres gêmeas ainda estavam em finalização em 1974, quando Petit logrou cruzá-las equilibrando-se em um cabo de aço, sem nenhum equipamento de segurança. Muitos dos andares já eram ocupados por empresas, mas os superiores ainda não, o que permitiu ao artista e seus seis ajudantes entrarem no edifício sem serem notados.
Na narrativa, somos introduzidos à infância de Petit na França, em cenas em preto e branco, quando ele assiste pela primeira vez uma apresentação de um equilibrista em um circo. A partir do momento em que ele começa a desenvolver sua habilidade, as cores surgem em cores muito vivas, representando o efeito da descoberta desse dom em sua vida. Petit apresenta-se ao líder da equipe de malabaristas do circo, Papa Rudy (Ben Kingsley), que se tornará seu treinador e guru.
O desafio
O filme então se concentra no esquema para conseguirem subir e montar o cabo para a travessia, transformando-se num thriller, como muitos que o cinema já retratou antes, mas com objetivo de roubar ou resgatar alguma coisa. Envolve o recrutamento da equipe, a estratégia, os ensaios, e, enfim, a execução. Nessa última etapa, há muita tensão e, parte dela ajuda a construir a antecipação da aflição da sequência da travessia. Isso porque um dos membros da equipe de Petit tem medo de altura e ele precisa se esconder sobre uma barra de cena que está numa vala de elevador ainda em construção.
Acompanhamos Petit passar a noite sem dormir, enquanto executa o plano de adentrar no prédio, e se exaurir montando os cabos para a travessia, sem contar que ele furou seu pé em um prego dias antes. Ou seja, sabemos que suas condições físicas são péssimas, quando ele está prestes a iniciar a travessia, o que aumenta a já tensa situação.
Vertigem
Utilizando tomadas de cima para baixo, onde se pode observar a vertiginosa altura abaixo de Petit, alternadas com recortes de seus pés sobre o cabo e closes de suas expressões faciais, Zemeckis nos leva para cima do Empire State. São momentos enervantes, potencializadas quando Petit decide não apenas cruzar de uma torre para outra, mas aproveitar o momento e permanecer muito tempo sobre o cabo. É como estar numa montanha russa que parece não terminar nunca. Não é de se estranhar que durante as projeções em Imax 3D nos Estados Unidos, muitos espectadores tenham passado mal.
Dessa forma, o feito extraordinário de Petit, com certeza inigualável, ganhou nas mãos de Zemeckis um filme que o dignifica.
Por fim, não há nenhuma menção ao atentado que destruiu uma das torres gêmeas e que as condenou à implosão. Mas as belas imagens finais de “A Travessia”, enaltecendo sua beleza, homenageiam em silêncio esse ícone norte americano. Se a Estátua da Liberdade é um presente da França para os EUA, coube também a um francês dar vida ao Empire State Building.
Ficha técnica:
A Travessia (The Walk, 2015) 123 min. Dir: Robert Zemeckis. Rot: Robert Zemeckis & Christopher Browne. Com Joseph Gordon-Levitt, Ben Kingsley, Charlotte Le Bon, Clément Sibony, César Domboy, Mark Camacho, Steve Valentine, James Badge Dale, Ben Schwartz, Benedict Samuel, Stuart Fink.
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