Assistir a Songs My Brothers Taught Me agora, depois que Chloé Zhao alcançou o prestígio com o premiado Nomadland (2019), nos permite traçar um estilo autoral da diretora.
Em Songs My Brothers Taught Me, já consta a preocupação em retratar com autenticidade algum recorte marginal da sociedade estadunidense. Se no seu mais recente filme o foco é os nômades que vivem em trailers, aqui o retrato apresenta os habitantes de uma reserva indígena.
A reserva se chama Pine Ridge, e lá vive o protagonista Johnny Winters. Aliás, tal qual em Nomadland, aqui Chloé Zhao também nomeia vários de seus personagens com o próprio nome dos atores. Na verdade, a maioria do elenco é composta por não-atores, que são habitantes reais da reserva. Essa característica lembra o neorrealismo italiano, movimento cinematográfico do pós-guerra na Itália. Enfim, Johnny Winters tem um irmão mais velho na cadeia, e o pai tem várias outras famílias. Quando o pai morre, só restam na casa ele, sua irmã mais nova e sua mãe.
A estória
Johnny é um rapaz ambicioso. Para ganhar dinheiro, ele vende contrabando de bebidas na reserva, apesar da ameaça de uma gangue que monopoliza esse comércio. Além disso, pretende fugir em breve com a namorada para Los Angeles, pois acredita que lá ele poderá crescer na vida. E isso deixará sua irmã muito triste, pois os dois se gostam muito. Então, após levar uma surra muito severa dos rivais, ele decidirá se segue com seu plano, ou se aceita um emprego numa mecânica local.
A estória em si é bem tênue. Apesar de apresentar um começo, meio e fim, relata um evento comum na vida de um jovem. É verdade que a decisão de Johnny na conclusão do filme define o seu futuro, mas Songs My Brothers Taught Me não explora isso como um grande evento melodramático. Dessa forma, Chloé Zhao se mantém fiel a sua abordagem realista, já que nós mesmos tomamos várias decisões ao longo de nossas vidas que poderiam ter mudado nossos destinos, e as tomamos sem que sejam um evento bombástico.
Poesia
Mais importante que a estória, é o retrato poético desse grupo de pessoas. De forma lúdica, o filme nos apresenta seus costumes, sua cultura, e como eles vivem. E somos impactados com o grau adiantado de civilização dos nativos, que vestem jeans e camiseta, e adotam nomes simples no lugar de suas designações originais. Por exemplo, Johnny Winters. Mesmo diante da restrição de bebidas alcoólicas, os jovens ousam se reunir para assistir a apresentações de uma banda de rock pesado formada por moradores da reserva, seguida de outra de música tradicional.
Por outro lado, esse tom poético instiga a uma comparação com o cineasta Terrence Malick, de Amor Pleno (2012). Principalmente, no início de Songs My Brothers Taught Me, quando ouvimos a narração do personagem, enquanto vemos belíssimas imagens variadas, captadas com a câmera na mão, no campo, durante o crepúsculo – a famosa “magic hour”, tendo como objeto pessoas comuns. Adicionalmente, Malick também se concentra mais na fotografia do que na estória.
Por fim, considerando Songs My Brothers Taught Me e Nomadland, identificamos uma cineasta com um estilo. Aliás, Chloé Zhao seria prato cheio para os críticos da nouvelle vague que introduziram a política do diretor autor. Porém, seu próximo filme, já em pós-produção, é Os Eternos, do Universo Marvel. Esperamos que Zhao, mesmo assim, consiga manter suas características.
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Ficha técnica:
Songs My Brothers Taught Me (2015) EUA. 98 min. Direção e roteiro: Chloé Zhao. Elenco: John Reddy, Jashaun St. John, Irene Bedard, Allen Reddy, Sam Rios, C.J. Janis, Jared Reddy, Eleonore Hendricks.